Review - Desvendando Dr.Who


Atenção: O que se segue é uma mescla de review e  análise de Dr.who, feita pelo mais novo colaborador do blog Matheus Nathan Inácio, e contém SPOILERS, prossiga por sua conta e risco.

Doctor Who segue as aventuras de um renegado Senhor do Tempo do planeta Gallifrey que simplesmente atende pelo nome de "Doutor". Ele fugiu de seu planeta natal em uma TARDIS, uma nave em formato de cabine policial britânica, que lhe permite viajar através do tempo e espaço. O Doutor raramente viaja sozinho, e muitas vezes traz um ou mais companheiros para compartilhar essas aventuras.

Lançada originalmente em 23 de novembro de 1963, a série inicialmente tinha como pedra fundamental ser um programa educacional para crianças, as instigando e chamando atenção acerca de história e ciências através da viagens no tempo/interplanetárias do Doutor como um meio para explorar ideias científicas e momentos famosos da história. Em lançamento até a atualidade, a obra é uma parte significativa da cultura popular britânica, considerada por muitos o programa mais importante já escrito pela rede britânica, detentora de diversos prêmios como a "mais bem sucedida" série de ficção científica de todos os tempos.

Doctor Who não possui uma premissa ruim, bem pelo contrário, é intuitivo e "novo" um alienígena que muda de rosto viajando pelo tempo e espaço numa cabine de polícia, são muitas possibilidades a se explorar, infinitos mundos, tempos e taxas que podem ser abordadas, ainda mais para o seu público alvo (em geral pessoas no início da adolescência) usando e abusando de efeitos especiais que muitas vezes dão certo, outras nem tanto. A série pode ser definida como uma espécie de "portal" que o telespectador entra para chegar até outros planetas e tempos, novas experiências ou revivendo antigas, com uma linguagem simples que atende aos requisitos do grupo, sem abusar de complexidade na hora de repassar a mensagem do episódio/arco.

A ideia do processo de regeneração/mudança de rosto do Doutor, talvez tenha sido a sacada mais genial da série, isso faz o plot não ser um refém do ator, ele pode ser substituído a qualquer momento e não causar um prejuízo direto a obra – como morte de personagens, reviravoltas bruscas, mudanças de personalidade etcetera –, sendo algo que poucas séries conseguem fazer. Graças a isso a série também consegue estar sempre em renovação, não só de aparência, mas personalidade central, pois cada regeneração trás uma personalidade e habituação diferente pro Doutor, alguns são humanamente preconceituosos (apesar de ser anacronismo), outros são extremamente tristes e reflexivo, outros alegres, avôs, tiozões e afins.

Os conflitos sobre a mudança, que é tida como uma morte, são construídos de uma maneira singular, é muito doloroso e sofrido mudar, as abordagens dela não são nada muito arrastadas, porém, nem curtas. Mas nem tudo são flores, os conflitos excessivos são uma excessão a regra criada pela série atual, anteriormente o Doutor regenerava, ficava confuso mas não existia aquele medo e "choro" exacerbado, ele não gostava mas também não repudiava. Foi uma mudança brusca sem explicação alguma, simplesmente se resumiu a "vamos pegar isso e usar para criar um personagem triste" mas se esqueceram totalmente que isso é um conceito longínquo da obra, não algo inventado agora, quebrando toda a mecânica dele e não explicando o porquê esse "desenvolvimento" ocorreu.

O protagonista, o Doutor, deve ser um dos protagonistas mais icônicos e bem escritos da mídia, ele é literalmente o pilar da série (esse ponto irei falar mais a frente) e de tudo que vem nela. Sua escrita é desenvolvida a partir duma reflexão do próprio personagem acerca do bem e mal, o bem não é uma estratégia prática de sobrevivência, pois ele exige lealdade, sacrifício e amor, mas o mal é diferente, ele não necessita disso, então o mal por qualquer análise deve sempre ser o vencedor, mas se ele deve, o que mantém a ordem no universo? O que impede que o mal vença? Algum evento cósmico ou entidade? O Doutor aceita esse papel mesmo sem saber, ele espalha a bondade pelo espaço tempo desde antes do início do universo até depois do fim (agradecimentos especiais: TARDIS), mesmo sendo a encarnação da bondade e esperança, não quer dizer que ele sempre é bom. O Doutor é bem humano nisso, quando causam mal àqueles que ele ama, todo aquele muro de bondade cai deixando a sombra da fúria tomar conta dele e dando o pior destino possível aquelas pessoas.

Muitas das vezes essa personalidade bondosa é o estopim para catástrofes, e o que ele faz depois disso? Continua totalmente bondoso? Não, ele fica conflituoso, de que adianta ser sempre bom se sua misericórdia faz com que massacres de inocentes ocorram? Porque tenho que ser bom? Que você não consiga salvar um mero indivíduo?. Ele sofre, especialmente suas encarnações 10º e 12º cuja escrita deles é mais voltada a expressar a dor, angústia, sofrimento e depressão, se questiona porque ainda está vivo se somente resta sofrer, porque ele tem que continuar com isso se no final servirá de nada. E nisso entra uma falha na escrita, quem em sua individualidade aguentaria continuar com uma vida que se resume a perdas, angústias e sofrimento simplesmente porque outros vão morrer? Sendo que estes mesmos possuem data de validade, o universo quase nunca foi bom com ele, mas ele SIMPLESMENTE aceita continuar sofrendo porque "Eles vão fazer tudo de errado sem mim", é algo tão "WTF" que soa de maneira estúpida, mas é o que acontece, não ocorrem um background construtivo pra decisão dele, simplesmente pedem pra ele continuar sofrendo sem descanso porque o universo vai chorar se ele partir. Isso realmente não é algo fácil de engolir quando você olha a fundo.

O Doutor é um personagem que você pode classifica-lo como complexo, não pelo lado "elitista" da coisa, mas sim por sua personalidade, ele ao mesmo tempo que é "unidimensional" em síntese com tudo aquilo da bondade, ele possui um abismo infinito em seu coração, preenchido de reflexões acerca da dor e solidão e por ele não ter uma construção especial nisso, não tem como definir exatamente como ele é, fica muito preso a 8 ou 80 variando da perspectiva de quem vê. Ele, ignorando as mudanças bruscas de personalidade causadas pelas regenerações, continua o mesmo de sempre, suas ideias são as mesmas, pensamentos os mesmos, modos de lidar com a vida e seus eventos, todos são os mesmos desde o 1 episódio da atual até agora. Na série clássica é mais digerível apesar de em suma ser a mesma coisa.

É um fato que o protagonista é o pilar de uma obra mas DW leva isso a um nível surreal, tirando o doutor, todos os personagens são profundos como um prato, servem somente de escada e alívio, muitos são completamente unidimensionais servindo somente para serem maus porque sim (aka 99% dos vilões da série) ai quando aparece um personagem com uma personalidade mais morna ele se destaca totalmente do resto, como a Donna, apesar dela não ser também grande coisa. TODO mas eu digo todo mesmo, trabalho e foco construtivo está no protagonista, ninguém além dele é desenvolvido, pouquíssimas vezes algum possui uma cena que realmente impacta o telespectador (como a morte da Amy), tudo é exclusivo do doutor.

A obra falha também em construir romances, o mais famoso da série, doutor e River existe basicamente porque; As linhas temporada deles são invertidas, o passado dele é o futuro dela e vice versa, então ele gosta dele porque sabe que no futuro vai gostar dela e ela gosta dele porque no passado ele era amoroso com ela (por que ele saberia que gostaria ela no futuro), nisso só tenho a perguntar, cadê a bendita da lógica? Isso é um insulto ao telespectador, não faz sentido, tentam construir algo complexo que é simplesmente falho em todos os sentidos.

O mundo de Doctor Who é estupidamente grande, um "multiverso com infinitos universos e infinitas possibilidades" (3rd) com diversos planetas e tempo mas ao mesmo tempo, a construção deles é quase nula, você só é apresentado ao planeta e sabe que tem problema nele, mas não o exploraram no micro nem no macro, como a localização dele. Mesmo planetas conceituados na obra como a Terra não escapam disso, parece que tudo se resume ao reino unido, só lá tem problemas e só lá é protegido, e nem ele é abordado direito já que normalmente tudo se resume a um único bairro da cidade que é descartado no outro episódio.

Agora vou fazer um pequeno resumo das convenções exorbitantes na obra:

> Plot armor demasiado do Doutor, ele não morre e não pode, mesmo um cara altamente treinados, com 4 alvos a sua frente não conseguiu acertar o doutor sem nenhum tipo de explicação, ele sempre encontra um meio de e salvar seja lógico ou não.
> Doutor e sua inteligência sendo usadas de maneira ruim, grande parte dos episódios tem como conceito principal o mistério e a tentativa de desvenda-lo, o correto seria um desenvolvimento através do episódio e descoberta de pistas, mas no caso do doutor não, ele sempre sabe a resposta antes de tudo mas só tá testando, jogando tudo na cara do telespectador sem explicação, insultando sua inteligência e análise
> Vilões sendo salvos pelo enredo; Doutor poderia ter evitado o nascimento de uma raça gênicos, mas convenientemente na hora, a bondade falou mais alto e ele evitou fazer isso.
> A lei "o doutor mente", melhor dizendo, tentativa-de-tapa-buraco-falha-do-Moffat, qualquer erro e furo da obra, o antigo show runner usava isso para tentar encobrir "não é bem assim, pode ter acontecido x e y mas lembre, o Doutor mente", viagens no tempo que gera paradoxos, deixar paradoxos ambulantes com uma máquina do tempo viajando no universo sem rumo e etc. Isso é usado de desculpa pela própria fandom, o que é até deprimente.

Um ponto alto da série são os discursos, que diga-se de passagem são divinos e adequados perfeitamente para o momento, muitos expressando mensagens com contextos sociais impactantes ou expressar a grandiosidade do Doutor. Sabem bem quando encaixar cenas tristes, alegres ou tensas, o timing é bem usado na maioria das vezes. Num geral, o enredo da obra é muito falho, a obra seguindo o modelo episódio não espera ter um fim, então não liga muito para os eventos de agora, qualquer contradição podem anular ela através de leia do tempo, o que gera diversas conveniências. A escrita é o ponto alto da obra, uma coisa que não pode se dizer é que os escritores são ruins, apesar de fazerem muita merda.

Nota:

Personagens: 5
Enredo: 5
Desenvolvimento: 4
Escrita: 7

Nota geral: 5,2/10

Se isso fosse uma análise do Doutor, a nota para personagem seria bem maior, porém, o número falho de personagens é estupidamente superior, o que não pode ser descartado.

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